A gestão da dívida nas Entidades Gestoras foi o mote para o encontro que a Comissão Especializada de Gestão de Clientes (CEGC) da APDA realizou na Fundação Dr. António Cupertino de Miranda, no Porto. O programa integrou três painéis, bem como a apresentação do Guia “Otimização da Cobrança das Entidades Gestoras em Baixa”, trabalho desenvolvido pela CEGC e patrocinado por diversas entidades.

A pandemia de COVID-19 teve impactos muito significativos na atividade das Entidades Gestoras, designadamente na atividade da cobrança, tendo em conta que durante o período mais crítico as entidades ficaram proibidas de realizar suspensões de fornecimento por dívida. De acordo com um inquérito remetido pela CEGC a todas as Entidades Gestoras do setor, ao qual se obteve 102 respostas, este decretamento repercutiu-se num aumento dos valores em dívida e de acordos de pagamento, tornando o processo de recuperação de dívida mais caro e moroso. Nuno Linares, membro da CEGC, apresentou estes resultados durante o encontro, acrescentando que as entidades que mais medidas adotaram foram as que apresentam um menor impacto negativo no crescimento da dívida.
Também a dar conta do panorama atual do setor esteve Raquel Correia Pinto, Advogada da Indaqua, que fez o enquadramento legislativo da cobrança, apresentando as principais figuras desse ciclo - faturação, cobrança, litígio -, bem como os principais diplomas vigentes. Expôs igualmente o esquema da recuperação da dívida e respetivos constrangimentos - acordos de pagamento e cobrança coerciva -, assim como contrapôs a prescrição versus a caducidade dos processos.

No painel dedicado à partilha de experiências, José Peças, Coordenador Comercial das Concessões da Aquapor, começou por sublinhar que a cobrança é o controlo da dívida, reforçando a necessidade de manter o cliente bem informado e esclarecido. Apresentou também os processos mais comuns de cobrança e de controlo da dívida. Já Emília Ferreira, Diretora Jurídica e de Contencioso da Águas e Energia do Porto, e Raquel Martins, Diretora Comercial da Águas da Região de Aveiro, expuseram quadros semelhantes, designadamente no contexto das contingências da pandemia de COVID-19, que obrigaram a uma mudança de paradigma no modelo de cobrança nas respetivas entidades, tornando-o mais adaptado e acessível ao cliente. Em matéria de recuperação de créditos, a alteração do modo de relacionamento com os clientes e os “pequenos” passos dados, fizeram a diferença. António Xavier, Diretor Comercial e CRM da Intrum, trouxe a perspetiva do serviço de cobrança prestado pela empresa pela qual é responsável. Nesse âmbito, demonstrou como esta categoriza o cliente-devedor em sete perfis, dando conta que este tem um comportamento diferente nas concessões, é mais recetivo no interior do país e que quanto mais recente é a dívida, melhor a cobrança. Negociar um valor inferior ideal para obter mais pagamentos, apresentar diversos meios de pagamento, melhorar os padrões de comunicação, bem como fazer diversas diligências, foram as sugestões mencionadas para aumentar a eficácia da cobrança.

Entretanto, o debate juntou Ana Cabral, Administradora da Águas e Energia do Porto, André Regueiro, Coordenador Regional da DECO, Carla Varela, Jurista do Departamento Jurídico da ERSAR, José Peças, Coordenador Comercial das Concessões da Aquapor, Luís Salvaterra, Diretor Geral da Intrum, e Nuno Campilho, Diretor Geral da ABMG - Águas do Baixo Mondego e Gândara. A reflexão demonstrou que o setor de abastecimento de água e saneamento é tido como especial porque fornece um serviço essencial à população, razão pela qual esta nutre um sentimento de pertença que faz o cliente esquecer, por vezes, de que para além dos direitos, também tem deveres para com a entidade gestora que presta os referidos serviços. Sendo a sociedade complexa, é, por isso, fundamental incrementar a confiança do cliente nas entidades gestoras, investir numa comunicação eficaz, que também transmita o verdadeiro valor da água, desburocratizar processos, facilitar e proporcionar diversos meios de pagamento, bem como prevenir o contencioso. Na suma das conclusões foi sublinhada a consciencialização de que a dívida também é uma perda, porque, para além de não haver sustentabilidade dos serviços sem cobrança, não é justo para o cliente cumpridor, sendo certo que deixar atrasar o pagamento também não ajuda o cliente-devedor. Entretanto, foi também discutido que a lei que atualmente se intitula de defesa do consumidor e que inclui a prescrição das dívidas com antiguidade superior a seis meses, acaba por resultar numa lei de defesa do devedor. Isto porque as custas judiciais podem ascender ao triplo do valor médio da fatura, facto que faz com que as entidades gestoras repensem/evitem qualquer ação de recuperação de dívida junto do devedor, sendo que, ao fazê-lo, aumentam em 4/5 vezes a dívida inicial, prejudicando a cobrança, bem como dificultando a liquidação aos que mais precisam. Nesta discussão foram referidos os exemplos de Espanha e França em que a prescrição é de cinco anos.

Antes da sessão de encerramento, teve lugar a apresentação do Guia “Otimização da Cobrança das Entidades Gestoras em Baixa”, cujo objetivo é contribuir para uma reflexão sobre os desafios e problemas das atividades que visam a redução de incobráveis, potenciando uma discussão sobre procedimentos utilizados, melhores práticas e restrições legais e regulatórias. Joana Frada, membro da CEGC, deu nota das principais diligências no desenvolvimento deste guia, evidenciando que “a dívida é uma perda que não precisamos de procurar, mas que é preciso trabalhar”.

Os cerca de 150 participantes deste encontro, que contou com o apoio da Águas e Energia do Porto, receberam um exemplar do livro apresentado.
