A Comissão Especializada de Legislação e Economia da APDA realiza, de dois em dois anos, o estudo “Água e Saneamento em Portugal – O Mercado e os Preços”. Ao permitir uma análise evolutiva do setor, o estudo transforma-se numa ferramenta de apoio às Entidades Gestoras, já que identifica vulnerabilidades e assimetrias entre as mesmas. A
edição de 2024 traz, para além da atualização dos dados anteriores, novos temas e abordagens, bem como um formato mais sustentável, sendo exclusivamente digital. Foi apresentado no colóquio “A Economia do Setor da Água – Realidade e Planeamento”, realizado no dia 7 de novembro, no Forte de Santiago da Barra, em Viana do Castelo.
Tendo como base de informação os dados recolhidos junto das Entidades Gestoras, independentemente da sua natureza, as tarifas referentes a 31 de dezembro de 2023 e as publicações da ERSAR, a edição deste ano atualiza a informação sobre os preços da água e do saneamento praticados no País, o enquadramento legal do setor, a caracterização das entidades gestoras quanto ao tipo, dimensão e distribuição geográfica, bem como a relação dos preços em “baixa” com os preços em “alta”.
A contratação pública e o princípio da unidade da despesa e a gestão das aquisições nas entidades gestoras dos sistemas públicos de água e saneamento, bem como a contratação pública em setores especiais (sociedades concessionárias) constituem as novas temáticas abordadas.
Pela relevância que tem vindo a assumir no dia-a-dia das Entidades Gestoras, a proteção de dados pessoais, através do RGPD, mereceu um maior desenvolvimento nesta edição.
A análise apresentada sobre a conjuntura do setor tem base em inquéritos realizados em 2021, 2022, 2023 e 2024, tendo sido, para a evolução do panorama internacional do setor, integrada uma entrevista com o ChatGPT, devidamente demonstrada no colóquio. Nesta intervenção foram conhecidos, por exemplo, quais os países com melhores níveis de desempenho na prestação de serviços urbanos de abastecimento e saneamento e quais os que apresentam melhores práticas de reutilização de águas residuais urbanas tratadas.
O programa do colóquio integrou também um dos temas essenciais para a sustentabilidade económico-financeira das Entidades Gestoras – a recuperação de gastos. Com recursos a conceitos como “Crowd thinking”, “Renda de monopólio” e “Subsídio implícito”, foi realizada uma análise retrospetiva ao financiamento e subsidiação do setor. O progresso a este nível tem-se revelado paulatino, mas com uma melhoria nos últimos anos. Por outro lado, e tendo em conta a heterogeneidade das entidades gestoras, concluiu-se que as análises e as respetivas propostas de solução deveriam ser mais direcionadas, tendo em conta as características de cada uma.
Igualmente em destaque, esteve o Plano Estratégico para o Abastecimento de Água e Gestão de Águas Residuais e Pluviais 2030 (PENSAARP 2030), que foi analisado por sete especialistas, designadamente quanto à implementação, financiamento e monitorização. Constituído por dois volumes - o Plano Estratégico e o Plano de Ação -, o PENSAARP identifica as linhas orientadoras para a presente década, convocando todos as partes envolvidas a atuarem em coerência. Dos investimentos previstos (5,5 mil milhões de euros), mais de 50% do valor está direcionado para a (tão reclamada) reabilitação de infraestruturas, estando o restante atribuído à adaptação de redes existentes e construção de novas.
Neste âmbito, as considerações sobre a pertinência e a importância do Plano para a sustentabilidade e o equilíbrio do setor foram unânimes, tendo o mesmo diagnosticado os problemas, identificado as soluções e previsto adaptações consoante as situações emergentes. Mas o sucesso de implementação do mesmo vai depender de decisões políticas e do acompanhamento dos intervenientes no setor.
Antes de tudo, foi reivindicada a criação do Grupo de Apoio à Gestão (GAG) do PENSAARP 2030 (que já se encontra em vigor desde fevereiro deste ano). O GAG 2030 é essencial para a monitorização e feedback do Plano, apoiar a sustentabilidade financeira, a governação e a sustentabilidade estruturável, dinamizando com as entidades competentes a alavancagem dos investimentos necessários no setor, bem como a realização das medidas previstas.
A capacitação dos técnicos, a retenção de recursos humanos, a maior autonomia das entidades gestoras (que devem adotar uma gestão mais empresarial) e o estabelecimento de um Pacto de Compromisso Nacional pelos Serviços de Água, foram igualmente requisitos identificados para alcançar os objetivos traçados pelo PENSAARP 2030. A recuperação de gastos foi novamente sublinhada como uma medida efetiva crucial para o setor.
Relativamente às autoridades competentes, como a ERSAR e a APA, foi sugerido que, no desempenho das respetivas e legítimas funções, devem atuar com ponderação, equilíbrio e respeito pelas partes, mas com determinação.
Tendo em conta que os apoios previstos no PENSAARP 2030 não vão ser suficientes para a elevação do setor, foi acautelado que “nenhum investimento ou origem de fundos devem ser descurados”.
Em suma, e tendo a perspetiva de entregar à próxima geração um setor eficiente e sustentável, é crucial ultrapassar as barreiras que perduram no tempo, tratando com igual intensidade as que vão emergindo, como a escassez de recursos hídricos, as alterações climáticas ou mesmo a transformação digital. Para que o País possa dar um salto qualitativo como o registado nos últimos 30 anos, é requerido o envolvimento e alinhamento entre os atores internos e externos ao setor, uma vez que, sem priorização e gradação de políticas e de atuação, as entidades gestoras, per si, não o conseguem fazer.